“Mormaço”: entre o realismo e alegoria, Marina Meliande radiografa as transformações urbanas do Rio de Janeiro

O roteiro de “Mormaço”, primeiro longa-metragem solo da diretora Marina Meliande, ganhou sua primeira versão em 2012, mas as transformações sofridas pelo Brasil e, principalmente, pelo Rio de Janeiro ao longo dos anos seguintes foi crucial para que Meliande chegasse à versão final do texto, filmada em 2016. Tudo começou como um reflexo do momento em que a capital carioca passava após a escolha para ser a cidade-sede das Olimpíadas de 2016.

“A cidade, de uma hora para a outra, ficou muito cara para morar. Todo mundo se viu trabalhando o dobro para manter o mesmo custo de vida. Começou com o processo de especulação imobiliária e transformação urbana e, aos poucos, os fatos foram contribuindo para a discussão desse sentimento de ser expulsa de um lugar, de não pertencer mais a uma cidade e de vivenciar políticas públicas que eram tomadas de cima para baixo, sem consulta popular ou discussão”, lembra a diretora.

Exibido no prestigiado Festival de Roterdã, “Mormaço” conta a história de Ana (Marina Provenzzano), uma jovem defensora pública que, ao se ver às voltas com movimentos de resistência na Vila Autódromo, um dos espaços ameaçados de remoção pela prefeitura para as obras das Olimpíadas, começa a ser consumida, literal e metaforicamente, por uma cidade cada vez mais opressora e conturbada socialmente.

“É o tipo de cinema que me interessa: aquele que reflete os tempos que estamos vivendo — e acho que estamos vivendo tempos muito sombrios”, avalia.

E Meliande viu alguns desses pesadelos de perto: ao descobrir as lideranças femininas de resistência na Vila Autódramo, começou a conviver com a comunidade local, que estava ameaçada de remoção, inclusive instalando o set de filmagens em uma das casas que, no dia posterior ao início das gravações, foi destruída.

“Nós filmamos essa destruição que de fato aconteceu, e foi um dia super tenso e emocionante. Todos tinham direito à terra, com documentação, mas a situação não passava de uma negociata da prefeitura com grandes empresas. Vimos de perto o impacto que aquilo teve na vida das pessoas, mas, ao mesmo tempo, era um misto de emoção e certeza porque percebemos que estávamos contando a história certa”, diz a diretora.

Paralelamente a isso, Meliande registra, através da protagonista Ana – uma mulher jovem, independente, bem sucedida e com vontades próprias -, o retrato de uma geração que ela conhece de perto: “Nesse tempo de idealização do filme, vi todos os meus amigos enlouquecidos, exaustos, exauridos com tanto trabalho apenas para pagar um custo de vida, a ponto de questionarem se o que fazia valia a pena e se não era melhor ir para uma cidade menor”.

Tanto acúmulo de pressões e exigências é representado no filme a partir de uma transformação física sofrida pela personagem e que faz “Mormaço” sair de um relato naturalista e quase documental para chegar ao plano da alegoria, flertando com o cinema de gênero. “O que eu mais gosto no cinema é a possibilidade dessa mescla de gêneros. A minha ideia era evitar um tom panfletário ou didático porque era um tema muito importante pra mim, e o cinema de gênero me ajudou a chegar nesse ponto mais poético, como se a história começasse de uma maneira e fosse se transformando em outra coisa dentro dela própria”.

Em competição no 46º Festival de Cinema de Gramado, onde fez a sua primeira exibição nacional, “Mormaço” tem previsão de estreia para o verão de de 2019.

(Texto: Matheus Pannebecker / Foto: Fábio Winter/Pressphoto)

Ministério da Cultura, Secretaria de Estado da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer e Snowland apresentam o 46º Festival de Cinema de Gramado. Lei de Incentivo à Cultura. Patrocínio: Stella Artois e Casa Aveiro By Dolores. Apoio especial: Gramado Parks. Apoio: Stemac Grupos Geradores, Lugano, Cristais de Gramado, Viviela London, G2 Net Sul e ENIT – Agência Nacional de Turismo da Itália. Apoio institucional: Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul, Fundacine, ACCIRS, IECINE, APTC/ABD RS, SIAV e Museu do Festival de Cinema de Gramado. Agência Oficial: Vento Sul Turismo. Transporte Oficial: Kia. Agente Cultural: AM Produções. Promoção: Prefeitura de Gramado. Financiamento Pró-Cultura RS, Secretaria de Estado da Cultura, Turismo, Esporte e Lazer, Governo do Estado do Rio Grande do Sul. Realização: Gramadotur, Ministério da Cultura, Governo Federal.

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